sábado, 3 de julho de 2010

Já vai em 31%...

Um estudo de uma tese universitária coordenada pelo ISCTE, em parceria com a Gulbenkian e o Instituto da Segurança Social, concluiu que 31% dos agregados portugueses vivem no limiar da pobreza, a que se juntam mais 20,1% classificados como pobres.

Ou seja, um total de 51,1% dos agregados familiares em Portugal - mais de metade – vive actualmente na miséria ou lá perto.

Acontece que estes 31% de agregados no limiar da pobreza integram adultos que ganham entre 379 e 799 euros (apenas um pouco acima da definição de «pobres», aplicada aos que ganham abaixo de 60% do rendimento médio), são geralmente constituídos por pessoas com escolaridade e qualificações superiores aos pais e neles abundam licenciados e até doutorados.

Por exemplo, uma das entrevistadas, identificada como Maria, tem 33 anos, é licenciada e declara que ir ao cinema ou comprar um livro entrou na categoria dos «luxos», enquanto Vera, de 35 anos, e Henrique, de 38 – ela com um bacharelato, ele doutorado – vivem de bolsas sucessivas e incertas e declaram sentir a vida «hipotecada».

Os autores do estudo concluíram também que estas pessoas, apesar de mais escolarizadas e qualificadas que os pais, sentem que estão «numa trajectória social intergeracionalmente descendente», onde «fazer planos é algo que a generalidade considera inglório».

Para os investigadores, os casos observados neste estudo confirmam a necessidade de se pôr fim aos regimes laborais que são propiciadores de pobreza – caso dos «falsos recibos verdes».

Finalmente, recorda-se que a taxa de pobreza é calculada já depois das transferências dos apoios sociais às famílias: sem esses apoios, os 20,1% de pobres oficialmente declarados subiriam para os 40% da população, o que, somado aos supracitados 31% de famílias no «limiar da pobreza», conduz à chocante conclusão de que 70% dos portugueses vivem actualmente na miséria ou a caminho dela.

Por coincidência, saiu também por estes dias um estudo conjunto da Capgemini e da Merrill Lynch informando que a lista dos milionários portugueses subiu, em 2009, dos 10 400 para os 11 mil – ou seja, em 2009, ano do começo da famosa «crise», brotaram em Portugal mais 600 milionários.

E não se iludam: «milionários», neste caso, não incluem os «borra-botas» que abicham umas centenas de milhares de euros/ano. Neste «clube dos milionários» só entra a malta dos milhões, como severamente define e escrutina a Merrill Lynch e quejandos.

Isto significa que, no próprio ano em que uma «crise» deu cobertura, em Portugal, a uma onda de desemprego, ao lançamento para o limiar da pobreza de 31% das famílias com emprego e à declaração oficial de 20% de pobres, houve 600 novos milionários a abotoarem-se com indefinidos milhares de milhões de euros, a juntar-se às ainda mais indefinidas centenas de milhares de milhões de euros abarbatados pelos 10 400 milionários já recenseados.

Só em 2009.

As «crises» do capitalismo dão sempre nisto: quanto mais miséria espalham, mais ricos originam.

Até as coisas chegarem ao ponto em que, para se acabar com a crise tem-se, forçosamente, de se pensar acabar com o que a engendra – o próprio capitalismo.

 
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